ENTREVISTA COM CLORALDINO SEVERO
O ex-ministro Cloraldino Severo em entrevista exclusiva ao SOS Caminhoneiro, após ter apresentado estudo sobre projeto que cria marco regulatório para os pedágios, na Assembléia Legilativa, disse que o governo do Estado do Rio Grande do Sul agiu corretamente ao denunciar os contratos das concessionárias de rodovias à União.
Perguntado em que se baseia para fazer tal afirmativa, respondeu : “Em primeiro lugar a União, em última análise, é quem delega e é a responsável pelo sistema, e quando se delega não se perde a responsabilidade. O próprio convênio foi claro a respeito disso quando definiu no Art. 12 a denúncia. As condições de denúncia estão ali, e o que o Governo do Estado fez agora Rigotto já tinha feito antes. Estão perfeitamente enquadrados na cláusula de denúncia evocada pela governadora e pelo governador Rigotto em 2006. A governadora apenas ratificou. É uma questão de vontade do Estado. Tu me delegou isso aqui, e eu não quero mais a delegação porque é impossível pra mim, exemplifica. Prosseguindo disse: O Estado mostrou com muita clareza que ele não tem como fazer aquelas atribuições que cumpriria fazer. Confessa que não está cumprindo, e de fato não está. O patrimônio da União provavelmente vai ser delapidado. Vai ter problemas. Eu não posso garantir na manutenção nas condições da delegação e não posso também oferecer correção das tarifas. Há uma impossibilidade administrativa real e está perfeitamente previsto no convênio que haja devolução. Portanto, a devolução é pacífica e é um ato unilateral do Estado do Rio Grande do Sul. A união não pode dizer que não cuida mais das estradas federais, ela tem que cuidar, porque se ela achar que o Estado abusou ao devolver, pode amanhã ou depois cobrar do Estado qualquer conseqüência que advenha disso. Agora, não pode deixar de receber. O que também não pode, é se estabelecer que o Governo do Estado queira que a União assuma pretensas dívidas, pois não há nenhuma que se tenha passado em julgado. Se não ocorrer solução o Estado, responderá pelo tempo em que ele geriu, e se dúvidas houverem entre o Estado e a União, deverão acertar pelos caminhos de arbitramento, negociação e eventualmente na Justiça. Mas eu espero que tenha solução”.
Pergunta: Como explicar para a sociedade essa “monstruosa” dívida que não se sabe realmente quanto é. São 600 milhões? São 1,2 milhões ou 1,7 milhões? Afinal, qual é o montante dessa dívida?
Cloraldino Severo: Esse é um carnaval de valores que ás empresas fazem para ganhar dinheiro e fazem em todos os seus pleitos. Entre fazer um pleito e o Estado reconhecer, Estado aqui de forma mais ampla, em qualquer situação cabe ao contratante aceitar ou não essas posições, isto é, admitir como legítimas ou não. Até hoje essa legitimidade não foi aceita. Portanto, não foi seguido os procedimentos legais para auditoria desses pretensos direitos, nem foi aberto o direito para que os usuários reclamem dos direitos que pensam ter. Por exemplo, da cobrança de um custo tarifário após 2004 que envolveu mais de R$ 50 milhões por ano pago a mais para as concessionárias, hoje atualizado, pode chegar a valores muito altos, de R$ 300 milhões a R$ 600 milhões, ou mais. Além disso, outros motivos de desajustes que as empresas argumentam ter direito. A leitura do contrato é outra. São riscos delas e não do Estado. O Estado não tinha porque segurar, portanto, ás empresas procuram passar. São coisas que lhe tragam mais lucros. E o que faltou exatamente, foram equipes adequadas, onde foram colocadas pessoas que de certa forma não se dispuseram a enfrentar os problemas na defesa do Estado. Existe um problema semelhante ao caso do DETRAN. Pretensas dívidas que alguns funcionários do Estado declaram em um momento ser de um valor X, que eles acham que é, mas não há nenhum processo que tenha chegado pelos meios legais à evidência de direito.
Pergunta: Como senhor vê essa questão do DAER se achar incompetente para fiscalizar, e daí esse imbróglio todo?
Resposta: Isso nós dissemos antes. Veja bem: quando começou isso eu já havia dito que era complicado, que tinha problemas. O DNER disse também no início quando Padilha pressionou o Governo do Estado, os técnicos afirmaram que se continuasse dessa forma se prenunciava um caos, porque o DAER não tinha condições. Na Comissão de Inquérito foi repetidamente dito isso: o DAER não fez a fiscalização; a AGERGS não fez a fiscalização; o presidente da AGERGS disse claramente de que ninguém cumpriu o contrato, nem Estado, nem as concessionárias, ninguém. Agora, o Diretor Geral do DAER, simples e honestamente assinala aquilo que nós já afirmávamos. Se olharmos os depoimentos que ocorreram na Comissão Parlamentar de Inquérito, no próprio relatório da CPI vamos verificar que lá expressa que o DAER não tinha condições de fiscalizar e muito menos a AGERGS, e que era necessário uma profunda reforma. Então o que se está fazendo? Está se entregando um problema de imensa complicação que não devia nem mesmo seguir este caminho inadequado. O contrato é absurdo, pra mim é inexeqüível e que, portanto teria que ser declarado nulo. O que acontece é isso, realmente. E mais, não tem condições para fiscalizar, não tem para assegurar o serviço adequado, que é obrigação legal, não tem para assegurar a modicidade da tarifa que também é uma obrigação legal, e não tem para assegurar a defesa do patrimônio. Então não há dúvida, não tem mais o que ficar discutindo. O que precisa urgentemente é o Governo Federal assumir a questão das rodovias federais e acertar algum esquema adequado, procurando o interesse da sociedade. Ambos poderiam chegar a um protocolo que defina os procedimentos para o esclarecimento da divergência.
Pergunta: Em síntese, o senhor é favorável a denúncia dos contratos como fez o Governo do Estado?
Resposta: Sim, eu concordo totalmente. Aliás, a mais de dois anos quando o Governo do Estado defendia o “Duplica Rio Grande” eu escrevi um documento que entreguei ao Ministério Público e a outros, afirmando que o “Duplica” era um tiro no pé dos gaúchos. O “Duplica” no sentido de prorrogação dos contratos. E desde aquele momento defendi – já defendia antes fortemente, que as estradas federais não eram para serem pagas pelos usuários gaúchos, e sim, pelo governo federal. Aquilo foi um erro grave pegar as estradas federais. O governo federal que sempre cuidou delas, cuidou muito bem. O estado do Rio Grande do Sul quase metade das estradas pavimentadas são federais. Em outros estados não é essa proporção. Quem pegou foi o governo Britto que fez esta besteira de assumir coisas que são federais.
Acho que a governadora está absolutamente certa, só lamento que ela não tenha dado força ao que o governador Rigotto fez no documento que ele encaminhou e que ela mostrou na documentação, conforme está no site do DAER. O Rigotto já teria feito isso. Não adianta o que passou. Adianta, sim, o que é absolutamente adequado o que ela está fazendo, e acho que é irrecusável o governo federal assumir as estradas federais imediatamente. Quanto a possíveis débitos anteriores penso que o governo federal vai reconhecer e não existe quem possa honestamente falar em débitos reais.